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PREFÁCIO
Pela música exteriorizamos o que está no inconsciente individual e coletivo e nos misturamos, interagimos, nos comunicamos, colocamos para fora o que está dentro e nos identificamos com a dimensão exterior, que acaba sendo uma extensão da dimensão psicológica interior.
Assim, o interno e o externo se relacionam estreitamente, do mesmo modo que o individual e o coletivo interagem. Nesta dinâmica relacional a música funciona como um veículo de integração de dimensões. Integração dentro de um processo que é dinâmico. Nossos conteúdos são emersos para dimensão exterior, de forma que, o que esteja dentro seja conhecido, reconhecido, para só assim ser trabalhado.
Considero uma limitação de compreensão do processo de integração através da música, a qualificação que fazemos desta ou daquela música pelo seu conteúdo, seu estilo, seu ritmo. Não existe música boa ou ruim existe a necessidade de expressão puramente humana. As pessoas expressam o que vivem.
Uma coisa é a identificação por esta ou aquela música, este ou aquele estilo musical, fenômeno natural do processo. Outra coisa é a rejeição com sinais de repúdio, que podem está expressando a auto-rejeição e o auto-repúdio dos aspectos constituintes do próprio ser.
Seja qual for a música, ainda assim ela funciona como instrumento de integração psicológica, uma vez que sinaliza através do que nos identificamos, rejeitamos ou repudiamos, nosso mundo íntimo a ser conhecido, reconhecido e trabalhado.
O preconceito musical pode ser a expressão e a combinação de vários sinais e sintomas, sejam íntimos e/ou coletivos, como nossa ignorância a respeito do processo integrador que a música desempenha; nosso etnocentrismo; nosso preconceito de classes; nossos mecanismos de defesa do ego, representado pela projeção psicológica dos conteúdos auto-reprováveis, projetados na música, e/ou no interprete, e/ou no estilo, e/ou nos seus adeptos, ou uma combinação destes objetos de transferências.
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REFLEXÃO
A música "Firme e Forte" de Psirico fala sobre resiliência, representada pela força, a firmeza, a capacidade de recomeçar do ser humano, que aprende a se reconstituir diante à tragédia. Coloca a fé como condição de superação e a alegria como o resultado disto, o que permite não enlouquecer.
No Brasil, como em outros países pobres e/ou emergentes, milhares de seres humanos vivem em situação de miséria, às margens dos morros e da sociedade. São os excluídos do sistema capitalista, que lutam por sobrevivência em seu cotidiano de diversas formas, sendo a criminalidade uma delas, que também nasce da exclusão. De forma que o mesmo Brasil do Carnaval é o Brasil da exclusão social.
Mas de onde nasce a alegria do povo brasileiro diante tanta miséria e sofrimento?
Como somos multi-étnicos, constituídos por uma diversidade de culturas, de cores, de ritmos buscamos a integração expressando todos os aspectos que nos constituem, nossos "anjos" e nossos "demônios", nossos momentos, pensamentos e sentimentos através da música.
De forma que pela música falamos de sexo, de política, de afeto, mas falamos também de fé, de nossa relação com a Divindade. Pela música o povo expressa a fé e a alegria é o resultado desta relação.
"Na encosta da favela "tá" difícil de viver, e além de ter o drama de não ter o que comer.
Com a força da natureza a gente não pode brigar
o que resta pra esse povo é somente ajoelhar,
e na volta do trabalho a gente pode assistir.
Em minutos fracionados a nossa casa sumir, tantos anos de batalha
Junto com o barro descendo e ali quase morrer é continuar vivendo."
A chuva que mata a sede, que serve à lavoura, que constrói é a mesma chuva que destrói. São forças naturais, mas que também refletem a ação humana. Logo, a força da natureza também ensina, pelos seus efeitos devastadores, sobre respeito, sobre conservação, sobre solidariedade, sobre fé.
"Êee chuá chuá, ê chuá chuá,
Temporal que leva tudo, mas minha fé não vai levar.
Êee chuá chuá, ê chuá chuá,
O meu Deus dai-me força pra outra casa levantar."
O ser humano aprende. De uma forma ou de outra, mas aprende. E a vida nos dá condições para, paulatinamente exercitar conteúdos de um aprendizado cada vez maior.
A dose certa de insatisfação é necessária e pode favorecer o crescimento, desde que tenhamos condições de perceber a nossa responsabilidade e potencialidade de transformação movida pela busca da satisfação.
Satisfação esta que se configura em vários níveis dentro de um processo, contínuo e complexo, que se estende desde a busca pela satisfação das necessidades mais imediatas, nos aproximando de outros animais, até a busca pela satisfação de necessidades mais complexas e mais elevadas, nos aproximando dos "anjos".
De forma, que o trajeto é singular, mas o processo é mesmo para todos, sendo que a noção de responsabilidade dentro deste processo sinaliza aproximação de sabedoria em determinado aspecto e contexto.
Aprender com a tragédia, sem vitimar-se e manter-se numa postura ativa, "firme e forte" também é sinal de sabedoria.
"Eu "tô" firme, forte
nessa batalha.
Eu "tô" firme, forte
Não fujo da raia.
Êeeehhh chuáaa...ooohhh!"
Por Marcelo Bhárreti
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